sexta-feira, 2 de maio de 2008

No country for old men!



Intrigante é o melhor termo que conheço para definir o último filme dos irmãos Coen, que esteve em cartaz no cine Santa Cruz. Como ocorre em todo bom filme, não é fácil definir a natureza da perturbação que ele provoca, pois não se trata de algo evidente. No início cheguei a imaginar que estava vendo um filme comum, pois a história toda parece seguir o mesmo percurso dos roteiros de violência e perseguição que dominam Hollywood: um psicopata implacável (Anton, protagonizado por pelo ator espanhol Javier Barden), guiado por um instinto calculado de morte e sangue, muitas mortes. A primeira incongruência, no entanto, é dada pela sutileza do cenário da trama: as belas paisagens do deserto texano, um recurso onde a poesia e a beleza são obrigadas a contracenar com o plano da destruição reinante representado na tremenda cena de abertura e, depois, na contraposição entre a calma do deserto e um matador moderno, representante dos novos tempos, que recria a morte pela tecnologia das armas letais, como o cilindro de gás usado para abater animais.
Ainda, a paisagem que desenhou os traços fortes do rosto dos vaqueiros, os brutos de “hábitos rudes e valores simples”, como disse certa vez Mr. Bush, aparece em franco contraste com a palidez e ausência de contornos físicos definidos, quase androgênico do visual do matador Anton, como se ele não fosse alguém, nenhuma pessoa, talvez a personificação do conceito de um mal racional, de uma morte determinada e certa.
Se poderia dizer que o filme conta a história de uma transformação no modo de vida, uma passagem onde homens velhos, acostumados com um ritmo do mundo, que não conseguem aprender a viver segundo a nova lógica das coisas. Mas não se trata propriamente de uma luta geracional, se trata da luta pela compreensão de uma realidade mutante, que extermina e apaga vidas, faz os destinos se dissiparem, as decisões acontecerem num lance de jogo e tudo aquilo que oferece terreno para assentar os pés, aquilo que delimita e ajuda a entender a nós mesmos, absorve-se numa guerra apocalíptica, destruindo e mergulhando a alma de todos numa atmosfera de incompreensão, de absurdo espectral, de maravilhamento negativo e impotente. Tommy Lee Jones, o xerife cansado e narrador do filme, encarregado de prender o assassino e proteger, não protege, está sempre atrás dos fatos. Depois de anos tentando compreender o que acontece, ele confessa: não há mais lugar para razões de nenhum tipo, a violência, os acontecimentos, tudo corre sem direção. Antes se matava por honra ou amor, agora, não se pode nem saber. “Achava que iria compreender, mas não compreendo”. E quem tenta entender pode talvez descobrir o simples raso: "it´s all about money and drugs", não há sentido, as questões supremas, a vida e o amor, perderam completamente sua relevância, fazemos parte de algo que não sabemos mais o que é.

Um comentário:

Alexandre N. Machado disse...

Adorei tua descrição do filme!! Muito boa mesmo! Abraço.

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