sábado, 27 de fevereiro de 2010

março vai começar sem mim

Encontrei com pelo menos quatro bons amigos nos últimos dias. Vivi horas maravilhosas ao lado deles. Isso me fez pensar sobre o significado da amizade, do trabalho e da vida, especialmente em função da rotina de atividade contínua e desgastante que venho tendo há uns 10 anos. Aulas, textos, cadernos para entregar, alunos, filhos, animais, casa, carro, corpo/saúde, descanso...tudo isso que deveria ser parte de uma vida vivida de maneira lenta e agradável tornou-se parte de um grande movimento que acompanho exausto. Falta-me planejar paradas longas e dias mansos. Não creio que seja falta de organização. Eu vejo bem meus problemas e tenho optado por eles. O que ainda não aprendi é ter sabedoria para me sentir em casa num mundo simples, parado, sem sobressaltos, com poucas pessoas circulando, com ventinho ou chuva tranquila na varanda. Eu queria morar na alma de Lao Tse. Olha só o que ele escreveu aqui...depois coloco. Tenho que ver o Francisco agora.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Revolucionário by Flavio




Quando era jovem
Lutei por uma
utopia socialista-liberal
gritei, perdi a voz
até descobrir

anos recentes

nada muda no mundo
a rua, a revolta, o amor, 
a poesia
o grão de chuva
na ventania.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Regras para ser feliz

1- Comer macarrão ao alho e óleo;
2- telefonar e encontrar os amigos de vez em quando;
3- abraçar os filhos;
4- passear com os cachorros;
5- assistir um bom filme
6- ler um bom livro
7- apreciar paisagens verdes e suaves
8- sentir o amor e o bem que brota do peito das pessoas
9- caminhar e respirar
10- tomar limonada 

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Dúvida



Faz séculos que não encontro tempo para visitar o cinema. Todo meu contato com o cinema vem, agora, da tv paga e de dvds locados. Na televisão, com excessão das estréias do telecine, não há nada especial para ver. Em geral, é sangue, vampiro e terror o tempo inteiro. Não sei para quem os cineastas americanos dirigem e quem define o tipo de filme que vai ser produzido. Certamente ninguém parecido comigo foi ouvido na pesquisa de mercado deles. Eu simplesmente não vejo graça nenhuma em filmes sangrentos, de bandidagem, assinatos e também nos filmes de terror. É claro que existem filmes de ação de boa qualidade, mas custa encontrar. Ou talvez eu seja um expectador sem graça, um boboca que não consegue ver a sutileza da violência urbana....a verdade é que faz falta, na minha pobre dieta cultural, filmes edificantes, que ajudem a pensar e viver ou simplesmente que sejam bom passatempo. Como não posso contar com a tv, fui na locadora e encontrei uma boa surpresa: Doubt. É um filme intrigante sobre um tema delicado e coberto de preconceitos: a pedofilia entre padres da igreja. Assisti com meu filhinho Francisco por perto, de modo que não lembro perfeitamente do roteiro. A pedofilia serve como uma espécie de tema condutor do filme (não sei como se chama isso na linguagem técnica da sétima arte), mas não é dele que resulta o melhor da película. O que gostei mesmo foi um tema moral que está presente na bela (como sempre) atuação da Meryl Streep. Ela é uma madre superiora, obediente e exigente quanto ao cumprimento das regras da Ordem. Diante da suspeita que o pároco de sua igreja (Phil Hoffman) pode estar tendo alguma relação indevida com um dos seus coroinhas, ela resolve investigar, faz ameaças ao padre e termina por conseguir seu afastamento da igreja. A moralidade entra no roteiro por dois caminhos: primeiramente, através de algumas mentiras que ela precisou inventar para não ser punida pelo padre (que era seu superior). O problema moral maior, no entanto, aparece bem no final (e tem relação com o título): a personagem mostra que todo seu rigorismo moral vem de uma forte confiança na tese que suas escolhas são as escolhas de Deus, que aquilo que defende encontra amparo na vontade de Deus. A tensão pelo enfrentamento e, em certa medida, a soberba e orgulho (necessários, diria Maquiavel) cegos que ela mostra em seu tentativa de 'provar' o crime do padre são balançados pela dúvida: e se ela estiver enganada naquela situação particular? e se ela estiver enganada em geral, ou seja, se sua atitude de rigor no cumprimento dos deveres da ordem não seja propriamente a vontade de Deus? E se a moral de Deus for amorosa e doce, uma moral ambigua e que admite pequenos deslizes, mais aberta para seres imperfeitos como nós, como defende o padre? se essa segunda alternativa for verdadeira, ela errou e é essa dúvida que a atormenta. Uma moral heterônoma não é livre de dificuldades: mesmo tendo Deus, temos de decidir o que está de acordo com a vontade de Deus. Esse é um tema que quero voltar a tratar.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

leituras


Finalmente voltei a fazer leituras livres e completamente não-técnicas. Mas logo esse tempo de renovação de energias intelectuais vai acabar. No final de fevereiro começa mais um semestre.
Vou deixar aqui a lista dos livros que não li e que pretendo ler ainda nesse ano (não necessariamente nessa ordem).

1- Confissão de Tolstoi (indicação do Jônadas)
2- The American Scholar de Emerson
3- Em busca do tempo perdido de Proust
4- Todos os diálogos de Platão
5- O Zoroastro de Zend Avesta (caso encontre).
6- The Right and the Good de Sir David Ross
7- The Development of Ethics de T. Irwin (indicação do Raphael)
8- A inconstância da Alma Selvagem de Viveiros de Castro (indicação do César)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Sonhos


Existe um fenômeno provocado pelos hábitos de pensamento formais (profissão, área de trabalho) e informais (preferências de leitura, conhecimento geral etc.) que, na falta de melhor nome, poderia ser chamado de padronização generalizante: percebe-se só alguns aspectos de um certo acontecimento ou fenômeno e esses aspectos são assumidos como padrão de entendimento e ponto de partida para qualquer explicação daquele fenômeno. É uma espécie de cegueira natural, não intencionada e um problema empírico difícil de resolver, pois um cientista ou diletante pode facilmente perceber o quão salutar é saltar para fora do paradigma da profissão ou do seu núcleo formativo, mas não conseguir nunca (ou só com muito custo) enxergar o que seria uma alternativa ao seu treinamento ou visão de mundo. Talvez um pequeno exemplo histórico ajude a entender o que estou querendo dizer: médicos ofuscados pelo sucesso das descobertas de Pasteur com bactérias tentaram durante muitos anos localizar o microorganismo responsável pelas avitaminoses (doenças funcionais como o escorbuto, béri-béri e outras). Por partilharem a crença de que todas as doenças resultam da ação de algum organismo vivo, foi necessário muito tempo para reconhecer que certas doenças são provocadas pelo tipo de alimento consumido pelas pessoas, quantidade, etc. Foi depois disso que a epidemiologia deu lugar, na medicina, à nutrição, dietética e ao estrondoso uso das vitaminas. Na ciência, esse estreitamento do olhar muitas vezes impede o progresso científico, cria intolerância contra abordagens rivais, reduz acontecimentos a um tipo de explicação geral admissível, mas também confere estabilidade e um certo cânone para a formação de profissionais.
Na vida comum, o estreitamento do olhar se manifesta no entendimento limitado dos problemas que envolvem a vida social e individual (amor, trabalho, amizade, doença), porém também produz reflexos positivos como uma espécie de senso de orientação e de auto-entendimento no interior de um grupo social.

E o filósofo, como se comporta diante de abordagens e tratamentos alternativos aos problemas que procura explicar? Filósofos sofrem muito da doença do aprisionamento do olhar. Um dos lugares em que ela me parece se manifestar muito claramente é no entendimento da nossa condição. A condição humana é um termo vago.Para evitar confusão usarei a expressão "condição humana" num sentido bastante restrito e particular (que me parece um pressuposto de todas as filosofias ocidentais seculares): ser humano significa, inter alia, ser mortal e dotado de uma faculdade da sensibilidade e razão que nos informa o que acontece no mundo físico e como devemos organizar dados sensíveis.
Nessa representação, o homem é uma espécie de ser que nasce, sobrevive através de sua capacidade de "ler o mundo", e morre. Gostaria de criticar um ponto em particular dessa imagem geral. Meu ponto diz respeito à sensibilidade. Não creio que a sensibilidade humana ou, ainda, que o único modo de entender o que ocorre ao nosso redor possa ser reduzido à categoria do sensível ou detectável. O que é o sonho, por exemplo, e qual seu lugar num entendimento de nossa condição? Pensemos no fenômeno bruto do sonho. Estamos dormindo e vemos imagens. Algumas dessas imagens são desconexas e não as lembramos durante o dia. Mas outras imagens oníricas são fortes, curativas, ricas, assustadoras. A filosofia (aquela que conheço) nada diz sobre a contribuição dos sonhos para o entendimento da sensibilidade humana. E se os sonhos forem uma forma de sentir? Uma forma de aprender coisas que a consciência desperta ou de vigília não consegue abarcar? Se o sonho for uma experiência sui generis e importante para o desvendamento de nossa condição?
Faço todas essas perguntas, pois já tive sonhos cruciais ou significativos que desempenharam um papel relevante no meu atual entendimento da vida. E, segundo me relatou um amigo, muitas pessoas contam que tiveram sonhos que desempenharam funções determinantes em suas vidas. Talvez o que nos falte seja uma teoria dos sonhos menos vinculada à vida diurna, como foi a teoria de Freud na interpretação dos sonhos. Talvez seja necessário construir uma teoria radical do sonho, como um fenômeno próprio e não menos significativo que a experiência de ver e tocar coisas, por exemplo. Não poderia ser o sonho uma habilidade sensível de ver nosso próprio futuro? Uma sensibilidade do amanhã (como acontece nos sonhos de deja vù)? Não poderia ser o sonho um mecanismo de acesso à realidades diferentes daquelas vividas quando estamos despertos? Mas se for assim, o que as experiências oníricas estão a dizer? Que não somos apenas seres físicos? É difícil de responder. Nossa melhor atitude aqui talvez seja a cautela: admitir que descrições filosóficas da sensibilidade podem não ser descrições completas de uma sensibilidade rica como a humana.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

felicidade


Os sábios dizem que a felicidade exige, em alguma medida, manter a mente tranquila, evitando altos e baixos. Os anos me ensinaram a viver a vida sem euforia ou tristeza profunda. Alegria e tristeza, embora pareçam forças infinitas quando as sofremos, um dia também serão sucedidas. Mas é difícil manter essa disciplina mental. Sabemos que as coisas mudam, mas é difícil não sentir esse agora feliz e bom!

"Quando outra virtude não haja em mim, há pelo menos a da perpétua novidade da sensação liberta". (Fernando Pessoa no Livro do Desassossego)