sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Nacionalismo





Sou um nacionalista inveterado, desses que se emociona ao ver a bandeira brasileira, um pano que raramente encontramos pendurado pelos cantos do Brasil. A desgraça é que quase todo nacionalista aparece montado numa ladainha conservadora de “Deus, Pátria e Família”, cheios de pensamento da idade da pedra. Quando os encontro, na internet, nos jornais, ao vivo, sempre me lembro de uma tirada genial do nosso Barão de Itararé contra os integralistas de Plínio Salgado.Ele dizia que quase entrou para as hostes dos “camisas verdes”, quando ouviu um deles gritando “Deus, Pátria e Família”, pois havia entendido: “Adeus pátria e família”.
Meu vínculo com o nacionalismo é, essencialmente, derivado da preocupação com a formação de uma cultura da emulação do brasileiro exemplar, um tipo de herói nacional que não é um homem de palha, sem estofo e oportunista. O humorista gaúcho Aparicio Torelly foi um grande brasileiro, mas duvido que três por cento da população brasileira tenha ouvido falar dele. Tudo o que fazemos com os bons exemplos é relegá-los ao esquecimento ou à indiferença. Está claro para mim que o futuro do Brasil depende de um alimento muito mais forte do que a ajuda de Deus ou do mito do atleta que era pobre e enriqueceu. Aproveito o post de hoje para apresentar um desses bons exemplos, na esperança que possamos algum dia cultivá-los melhor.
Seu nome é Roberto. Tem um forte sotaque americano, herdado dos anos vividos em exílio com a família de seu avô, o ex-governador da Bahia Octávio Mangabeira. Desde sua infância revelou enorme inteligência e, aos dez anos, com a morte de seu pai, o advogado americano Arthur Unger, retornou ao Brasil.
Depois de completar sua formação superior no Rio de Janeiro voltou a estudar no exterior. Destacou-se entre seus colegas e o brilhantismo valeu-lhe o cargo de professor, aos 22 anos, na prestigiada Universidade de Harvard. Em Harvard, Roberto Mangabeira Unger lecionou por 30 anos. Não foi mais um professor, mas um dos autores mais originais nas áreas da teoria social e do pensamento filosófico e jurídico. É, incrivelmente, um dos poucos intelectuais brasileiros que é mais conhecido fora do país do que aqui dentro.
Mesmo no exterior, sempre ocupou-se do futuro do Brasil e quando tornou-se ministro do governo Lula, os telejornais fizeram pouco mais do que chamar atenção para o “carregado sotaque americano” do professor e repetiram, bastas vezes, uma declaração hostil que havia dado sobre esse mesmo governo que passara a integrar. Nada a respeito de sua história de brilho intelectual, nada sobre sua contribuição para o pensamento político, social, e o civismo foi retratado. Apesar de ser um exemplo de competência, brilho, a imprensa só conseguiu lembrar que “estamos diante de um ministro que mal fala português”.
Mangabeira não desperta muitas paixões, é um homem bastante sóbrio e racional, às vezes possesso, mas é uma boa peça para rebater a ingrata mania de doar prestígio público ao personagem da telenovela, ao cantor estúpido, ao atleta truculento que rouba nossa dignidade todo dia. Esse mesmo ministro esteve no RS para apresentar propostas para um novo modelo de desenvolvimento para o Brasil, tendo o Rio Grande como “laboratório de políticas nacionais”. Indagado acerca da escolha do RS para iniciar seu trabalho, ele disse: “o Estado ostenta historicamente muitos dos traços do tipo de organização social e econômica que desejamos para o Brasil. Acalentou grande desconcentração de propriedades, uma economia que é marcada pela difusão. Ao mesmo tempo, o Rio Grande do Sul sustentou a cultura cívica mais avançada do país”. Não sei o que o resto do Brasil pensa, é hoje um feito incomum e louvável lembrar a importância da cultura cívica como uma base para um modelo de desenvolvimento nacional.

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