Professores e Pesquisadores de Filosofia Apoiam Dilma Rousseff para a Presidência da República
Professores e pesquisadores de Filosofia, abaixo assinados, manifestamos nosso apoio à candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República. Seguem-se nossas razões.
Os valores de nossa Constituição exigem compromisso e responsabilidade por parte dos representantes políticos e dos intelectuais
Nesta semana completam-se vinte e dois anos de promulgação da Constituição
Federal. Embora marcada por contradições de uma sociedade que recém
começava a acordar da longa noite do arbítrio, ela logrou afirmar
valores que animam sonhos generosos com o futuro de nosso país. Entre os
objetivos da República Federativa do Brasil estão “construir uma
sociedade livre, justa e solidária”, “garantir o desenvolvimento
nacional”, “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais”.
A vitalidade de nossa República depende do efetivo compromisso com tais
objetivos, para além da mera adesão verbal. Por parte de nossos
representantes, ele deve traduzir-se em projetos claros e ações
efetivas, sujeitos à responsabilização política pelos cidadãos. Dos
intelectuais, espera-se o exame racionalmente responsável desses
projetos e ações.
Os oito anos de governo Lula constituíram um formidável movimento na
direção desses objetivos. Reconheça-se o papel do governo anterior na
conquista de relativa estabilidade econômica. Ao atual governo, porém,
deve-se tributar o feito inédito de conciliar crescimento da economia,
controle da inflação e significativo desenvolvimento social. Nesses oito
anos, a pobreza foi reduzida em mais de 40%; mais de 30 milhões de
brasileiros ascenderam à classe média; a desigualdade de renda sofreu
uma queda palpável. Não se tratou de um efeito natural e inevitável da
estabilidade econômica. Trata-se do resultado de políticas públicas
resolutamente implementadas pelo atual governo – as quais não se limitam
ao Bolsa Família, mas têm nesse programa seu carro-chefe.
Tais políticas assinalam o compromisso do governo Lula com a realização dos
objetivos de nossa República. Como ministra, Dilma Rousseff exerceu um
papel central no sucesso dessa gestão. Cremos que sua chegada à
Presidência representará a continuidade, aprofundamento e
aperfeiçoamento do combate à pobreza e à desigualdade que marcou os
últimos oito anos.
Há razões para duvidar que um eventual governo José Serra ofereça os
mesmos prospectos. É notório o desprezo com que os programas sociais do
atual governo – em particular o Bolsa Família – foram inicialmente
recebidos pelos atores da coligação que sustenta o candidato. Frente ao
sucesso de tais programas, José Serra vem agora verbalizar sua adesão a
eles, quando não arroga para si sua primeira concepção. Não tendo ainda,
passado o primeiro turno, apresentado um programa de governo, ele nos
lança toda sorte de promessas – algumas das quais em franco contraste
com sua gestão como governador de São Paulo – sem esclarecer como
concretizá-las. O caráter errático de sua campanha justifica ceticismo
quanto à consistência de seus compromissos. Seu discurso pautado por
conveniências eleitorais indica aversão à responsabilidade que se espera
de nossos representantes. Ironicamente, os intelectuais associados ao
seu projeto político costumam tachar o governo Lula e a candidatura
Dilma de populistas.
A despeito da súbita conversão da oposição às políticas sociais do atual
governo, ainda ecoam entre nós os chavões disseminados por ela sobre os
programas de transferência de renda implementados nos últimos anos: eles
consistiriam em mera esmola assistencialista desprovida de mecanismos
que possibilitem a autonomia de seus beneficiários; mais grave,
constituiriam instrumento de controle populista sobre as massas pobres,
visando à perpetuação no poder do PT e de seus aliados. Tais chavões
repousam sobre um equívoco de direito e de fato.
A história da democracia, desde seus primeiros momentos na pólis
ateniense, é a história da progressiva incorporação à comunidade
política dos que outrora se viam destituídos de voz nos processos
decisórios coletivos. Que tal incorporação se mostre efetiva pressupõe
que os cidadãos disponham das condições materiais básicas para seu
reconhecimento como tais. A cidadania exige o que Kant caracterizou como
independência: o cidadão deve ser “seu próprio senhor (sui iuris)”, por conseguinte possuir “alguma propriedade (e qualquer habilidade, ofício, arte ou ciência pode contar como
propriedade) que lhe possibilite o sustento”. Nossa Constituição vai ao
encontro dessa exigência ao reservar um capítulo aos direitos sociais.
Os programas de transferência de renda implementados pelo governo não
apenas ajudaram a proteger o país da crise econômica mundial – por
induzirem o crescimento do mercado interno –, mas fortaleceram nossa
democracia ao criar bases concretas para a cidadania de milhões de
brasileiros. Se atentarmos ao seu formato institucional, veremos que
eles proporcionam condições para a progressiva autonomia de seus
beneficiários, ao invés de prendê-los em um círculo de dependência. Que
mulheres e homens beneficiados por tais programas confiram seus votos às
forças que lutaram por implementá-los não deve surpreender ninguém –
trata-se, afinal, da lógica mesma da governança democrática. Senhoras e
senhores de seu destino, porém, sua relação com tais forças será
propriamente política, não mais a subserviência em que os confinavam as oligarquias.
As liberdades públicas devem ser protegidas, em particular de seus paladinos de ocasião
Nos últimos oito anos – mas especialmente neste ano eleitoral – assistiu-se
à reiterada acusação, por parte de alguns intelectuais e da grande
imprensa, de que o presidente Lula e seu governo atentam contra as
liberdades públicas. É verdade que não há governo cujos quadros estejam
inteiramente imunes às tentações do abuso de poder; é justamente esse
fato que informa o desenvolvimento dos sistemas de freios e contrapesos
do moderno Estado de Direito. Todavia, à parte episódios singulares –
seguidos das sanções e reparos cabíveis –, um olhar sóbrio sobre o nosso
país não terá dificuldade em ver que o governo tem zelado pelas
garantias fundamentais previstas na Constituição e respeitado a
independência das instituições encarregadas de protegê-las, como o
Ministério Público, a Procuradoria Geral da República e o Supremo
Tribunal Federal.
Diante disso, foi com desgosto e preocupação que vimos personalidades e
intelectuais ilustres de nosso país assinarem, há duas semanas, um
autointitulado “Manifesto em Defesa da Democracia”, em que acusam o
governo de tramas para “solapar o regime democrático”. À conveniência da
candidatura oposicionista, inventam uma nova regra de conduta
presidencial: o Presidente da República deve abster-se, em qualquer
contexto, de fazer política ou apoiar candidaturas. Ironicamente,
observada tal regra seria impossível a reeleição para o executivo
federal – instituto criado durante o governo anterior, não sem sombra de
casuísmo, em circunstâncias que não mereceram o alarme da maioria de
seus signatários.
Grandes veículos de comunicação sistematicamente alardeiam que o governo Lula e
a candidatura Dilma representam uma ameaça à liberdade de imprensa,
enquanto se notabilizam por uma cobertura militante e nem sempre
responsável da atual campanha presidencial. As críticas do Presidente à
grande imprensa não exigem adesão, mas tampouco atentam contra o regime
democrático, em que o Presidente goza dos mesmos direitos de todo
cidadão, na forma da lei. Propostas de aperfeiçoamento dos marcos legais
do setor devem ser examinadas com racionalidade, a exemplo do que tem
acontecido em países como a França e a Inglaterra.
Se durante a campanha do primeiro turno houve um episódio a ameaçar a
liberdade de imprensa no Brasil, terá sido o estranho requerimento da
Dra. Sandra Cureau, vice-procuradora-geral Eleitoral, à revista Carta
Capital. De efeito intimidativo e duvidoso lastro legal, o episódio não
recebeu atenção dos grandes veículos de comunicação do país, tampouco
ensejou a mobilização cívica daqueles que, poucos dias antes, publicavam
um manifesto contra supostas ameaças do Presidente à democracia
brasileira. O zelo pelas liberdades públicas não admite dois pesos e
duas medidas. Quando a evocação das garantias fundamentais se vê
aliciada pelo vale-tudo eleitoral, a Constituição é rebaixada à mera
retórica.
Estamos convictos de que Dilma Rousseff, se eleita, saberá proteger as
liberdades públicas. Comprometidos com a defesa dessas liberdades,
recomendamos o voto nela.
Em defesa do Estado laico e do respeito à diversidade de orientações espirituais, contra a instrumentalização política do discurso religioso
A Constituição Federal é suficientemente clara na afirmação do caráter
laico do Estado brasileiro. É garantida aos cidadãos brasileiros a
liberdade de crença e consciência, não se admitindo que identidades
religiosas se imponham como condição do exercício de direitos e do
respeito à dignidade fundamental de cada um. Isso não significa que a
religiosidade deva ser excluída da cena pública; exige, porém,
intransigência com os que pregam o ódio e a intolerância em nome de uma
orientação espiritual particular.
É, pois, com preocupação que testemunhamos a instrumentalização do
discurso religioso na presente corrida presidencial. Em particular,
deploramos a guarida de templos ao proselitismo a favor ou contra esta
ou aquela candidatura – em clara afronta à legislação eleitoral. Dilma
Rousseff, em particular, tem sido alvo de campanha difamatória baseada
em ilações sobre suas convicções espirituais e na deliberada distorção
das posições do atual governo sobre o aborto e a liberdade de
manifestação religiosa. Conclamamos ambos os candidatos ora em disputa a
não cederem às intimidações dos intolerantes. Temos confiança de que um
eventual governo Dilma Rousseff preservará o caráter laico do Estado
brasileiro e conduzirá adequadamente a discussão de temas que, embora
sensíveis a religiosidades particulares, são de notório interesse
público.
O compromisso com a expansão e qualificação da universidade é condição da construção de um país próspero, justo e com desenvolvimento sustentável
É incontroverso que a prosperidade de um país se deixa medir pela
qualidade e pelo grau de universalização da educação de suas crianças e
de seus jovens. O Brasil tem muito por fazer nesse sentido, uma tarefa
de gerações. O atual governo tem dado passos na direção certa. Programas
de transferência de renda condicionam benefícios a famílias à
manutenção de suas crianças na escola, diminuindo a evasão no ensino
fundamental. A criação e ampliação de escolas técnicas e institutos
federais têm proporcionado o aumento de vagas públicas no ensino médio.
Programas como o PRODOCENCIA e o PARFOR atendem à capacitação de
professores em ambos os níveis.
Em poucas áreas da governança o contraste entre a administração atual e a
anterior é tão flagrante quanto nas políticas para o ensino superior e a
pesquisa científica e tecnológica associadas. Durante os oito anos do
governo anterior, não se criou uma nova universidade federal sequer; os
equipamentos das universidades federais viram-se em vergonhosa penúria;
as verbas de pesquisa estiveram constantemente à mercê de
contingenciamentos; o arrocho salarial, aliado à falta de perspectivas e
reconhecimento, favoreceu a aposentaria precoce de inúmeros docentes,
sem a realização de concursos públicos para a reposição satisfatória de
professores. O consórcio partidário que cerca a candidatura José Serra –
o mesmo que deu guarida ao governo anterior – deve explicar por que e
como não reeditará essa situação.
O atual governo tem agido não apenas para a recuperação do ensino
superior e da pesquisa universitária, após anos de sucateamento, como
tem implementado políticas para sua expansão e qualificação – com
resultados já reconhecidos pela comunidade científica internacional. O
PROUNI – atacado por um dos partidos da coligação de José Serra –
possibilitou o acesso à universidade para mais de 700.000 brasileiros de
baixa renda. Através do REUNI, as universidades federais têm assistido a
um grande crescimento na infraestrutura e na contratação, mediante
concurso público, de docentes qualificados. Programas de fomento,
levados a cabo pelo CNPq e pela CAPES, têm proporcionado um sensível
aumento da pesquisa em ciência e tecnologia, premissa central para o
desenvolvimento do país. Foram criadas 14 novas universidades federais, testemunhando-se a
interiorização do ensino superior no Brasil, levando o conhecimento às
regiões mais pobres, menos desenvolvidas e mais necessitadas de apoio do
Estado.
Ademais, deve-se frisar que não há possibilidade de desenvolvimento sustentável e
preservação de nossa biodiversidade – temas cujo protagonismo na atual
campanha deve-se à contribuição de Marina Silva – sem investimentos
pesados em ciência e tecnologia. Não se pode esperar que a iniciativa
privada satisfaça inteiramente essa demanda. O papel do Estado como
indutor da pesquisa científica é indispensável, exigindo um compromisso
que se traduza em políticas públicas concretas. A ausência de projetos
claros e consistentes da candidatura oposicionista, a par do lamentável
retrospecto do governo anterior nessa área, motiva receios quanto ao
futuro do ensino superior e do conhecimento científico no Brasil – e,
com eles, da proteção de nosso meio-ambiente – no caso da vitória de
José Serra. A perspectiva de continuidade e aperfeiçoamento das
políticas do governo Lula para o ensino e a pesquisa universitários
motiva nosso apoio à candidatura de Dilma Rousseff.
Por essas razões, apoiamos a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da
República. Para o povo brasileiro continuar em sua jornada de
reencontro consigo mesmo. Para o Brasil continuar mudando!
06 de outubro de 2010
Para os interessados em assinar o manifesto, favor enviar email com nome completo, vínculo institucuinal e demais informações que acharem relevantes para o endereço:manifestoprodilma@gmail.com. O link para assinaturas na internet desse manifesto é: https://sites.google.com/site/manifestofilosofosprodilma/home/assinaturas
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